FREI BETO DIZ QUE O PT E
LULA PERDERAM O RUMO
A entrevista " A vocação
literária de frei Betto", feita por Manuel da Costa Pinto para a revista
Cult (edição 201), é uma pedrada na alma do PT e nas incoerências da esquerda
no Brasil. O ideólogo mais barulhento da Teologia da Libertação, que deixa
sempre o Vaticano de orelha em pé, faz uma advertência muito pertinente sobre a
perigosa despolitização da juventude brasileira.
Na crítica que faz da esquerda,
o frei dominicano e escritor Carlos Alberto Libânio Christo pega pesado com o
PT: "Não é fácil ser de esquerda em um mundo tão sedutor quanto o do
capitalismo neoliberal. Daí o problema do PT, que foi perdendo o horizonte
histórico de um projeto Brasil e trocando-o pelo horizonte imediato de um
projeto de poder".
Frei Betto resume qual foi o
erro maior de Lula-Dilma: "É um governo que fez a inclusão econômica na
base do consumismo e não fez inclusão política. As pessoas estavam consumindo,
o dinheiro rolando e a inflação sob controle, mas não se criou sustentabilidade
para isso. Agora a farra acabou, está na hora de pagar a conta e chama-se o
Joaquim Levy [ministro da Fazenda]".
Frei Betto aponta a ferida:
"O erro do Lula foi ter facilitado o acesso do povo a bens pessoais, e não
a bens sociais – o contrário do que fez a Europa no começo do século 20, que
primeiro deu acesso a educação, moradia, transporte e saúde, para então as
pessoas chegarem aos bens pessoais. Aqui, não. Você vai a uma favela e as
pessoas têm TV a cores, fogão, geladeira, microondas (graças à desoneração da
linha branca), celular, computador e até um carrinho no pé do morro, mas estão
morando na favela, não têm saneamento, educação de qualidade".
Frei Betto identifica quando o
PT abandonou seu projeto inicial: "Isso desaparece na campanha de 2002,
quando o PT faz a opção de assegurar a governabilidade pelo mercado e pelo
Congresso – daí as alianças e a Carta aos Brasileiros, que na verdade é a carta
aos banqueiros. Ali, o PT abandona sua matéria-prima, que são os movimentos
sociais pelos quais deveria ter assegurado a governabilidade, como fez Evo
Morales na Bolívia (...) O PT optou pelo mercado e pelo Congresso. Agora, está
refém dos dois e pagando um preço muito alto. Tanto que chamou um homem do
mercado para ver se melhora a economia e entregou a parte política para o
PMDB".
Frei Betto relata sua decepção:
"Achei que a Carta aos Brasileiros fosse uma coisa tática, que, uma vez
eleito, o PT faria reformas estruturais, tributária, agrária, algum tipo de
reforma. Estava altamente entusiasmado. Sempre fui convidado para trabalhar em
administração, mas nunca quis trabalhar nem para a iniciativa privada nem para
governos. Gosto dessa vida cigana, solta. Quando Lula foi eleito e me convidou
para o Fome Zero, achei que trabalhar com os mais pobres entre os pobres – os
famintos – se enquadrava em minha perspectiva pastoral e tive todo apoio de
meus superiores dominicanos e até de Roma".
Frei Betto prossegue:
"Fiquei dois anos e, de repente, o governo matou o Fome Zero para
substituí-lo pelo Bolsa Família. Tive então a certeza de que essa opção
contrariava a tudo aquilo que o PT vinha pregando desde a fundação. O Fome Zero
era um programa emancipador, o Bolsa Família é compensatório. O Fome Zero ia
mexer na estrutura do país e por isso foi boicotado pelos prefeitos. Era
coordenado por comitês gestores municipais, não passava pelos prefeitos, não
havia como usar os recursos para fazer jogo eleitoreiro, então os prefeitos se
rebelaram, pressionaram a Casa Civil, que pressionou Lula. No fim, Lula cedeu e
eu caí fora".
Na entrevista, Frei Betto também
não vê clima para uma intervenção militar no Brasil: "Não me preocupam
ameaças de impeachment ou golpe. Não há caldo de cultura. Os militares nem saem
de farda na rua. Militar, no Brasil, antes andava orgulhosamente de farda, até
para arrumar namorada… O que me preocupa é a despolitização da juventude
brasileira. Os segmentos de esquerda deveriam estar preocupados com a
politização, como houve imensamente nos anos 70 e 80. Não há mais formação de
consciência crítica – e aí o pessoal vai no emocional, no oba-oba da volta dos
militares, sem ter ideia do que foi a ditadura, que pode parecer que foi
tranquila, mas é porque havia uma censura brutal. Estamos voltando a esse nível
de desinformação, a esse horror à política".
Frei Betto identifica o problema
em sua visão ideológica: "O principal problema filosófico hoje é a
desistoricização do tempo. Isso se reflete na esquerda mundial, que está
perdendo o horizonte histórico (não tem utopia, não tem projeto), e também no
plano pessoal – a dificuldade de se ter projeto pessoal na vida profissional,
artística, afetiva (todos ficam vulneráveis a qualquer dificuldade na relação
conjugal). Isso está nos levando à falta de esperança, e faz com que a
discussão política desça do racional ao emocional. Sempre participei de
discussões políticas e nunca vi nível de animosidade tão forte como agora,
porque se apagou o horizonte histórico". (Fonte: Alerta Toal)
A reportagem completa com Frei
Betto pode ser lida na revista CULT no link:
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